20/06/2013
Se nos fixamos nos desfiles-espetáculo das grandes marcas, nacionais e internacionais, o estilista faz sua aparição uns poucos segundos no “carrossel” (a conhecida volta depois das modelos) o que já anuncia o final do evento. Tudo isso, normalmente em 15 ou 20 minutos, no máximo e, ocasionalmente um pouco mais. Para as pessoas que estão acostumadas a assistir aos desfiles como aquele evento – e cada vez mais – quase intangível, onde as modelos realizam o passe e a figura do criador, o estilista, aparece a saudar os convidados ao final, nada demais, o básico. Já um desfile ao estilo Maison petit comité, como os realizados em antigas casas que produziam trajes especiais, as modelos passavam diante dos clientes, com o criador presente, exibindo os detalhes que pontuavam um trabalho elaborado durante meses, chegando até um ano ou mais, com um seleto grupo de profissionais envolvidos. Apesar de serem duas referências importantes, os estilos são opostos. Justapondo as ideias do “desfile-espetáculo”, dimensionado ao estilo petit comité, no sentido de conferir um ar intimista ao evento, acercando ainda mais o público das “bases da criação”, veio a decisão fazer uma exposição com algumas imagens e elementos do working progress. E ainda que não se pretendesse romper por completo o “mistério das aparições”, muitas vezes tão necessário em eventos onde criador e criatura são de certa forma, “efêmeros” – porém nunca a criação (o ato criador) – nutri o desejo realizar um desfile e posteriormente uma exposição referente ao processo criativo.
Sempre admirei a beleza das iluminuras dos livros antigos. Por um momento pensei em transformar esses desenhos decorativos que emolduram os escritos em linguagem têxtil. Mas o sonho de realizar e a realização em si resultariam um processo mais demorado que o normal para a criação e, sobretudo, para produção de uma coleção.
Assim mesmo comecei as pesquisas. No princípio, como costumo fazer, tentando buscar uma “soltura” com os “elementos”, depois de alguns “rabiscos”, surgiu uma idéia, uma imagem (a velha imagem do livro aberto contando uma história) e ao mesmo tempo brincando com a silhueta medieval, delgada, assexuada, teocêntrica, típica figura dos personagens das iluminuras medievais – com um dos meus croquis antigos – que logo serviu para o projeto gráfico do evento. Esse momento “onírico”, do papel, do croquis, quando a percepção (o real) ainda não chega a dominar o sonho, é fantástico! Lançamento de coleção: Códice – Hotel Rey Juan Carlos I – Moon Garden – desfile e exposição do processo criativo. Barcelona, junho/2013. pensava na forma. Não somente a da silhueta medieval, mas com tantos estilos de iluminuras de épocas diferentes, tinha que eleger aquilo que mais se aproximava do que queria. Naquele momento sabia que queria sair da tendência do atual “estampado”, já tão utilizado.
O aspecto naturalista dessas iluminuras com folhinhas, flores, árvores e animais, sugeriam um tipo de têxtil mesclado com detalhes em seda e organza, ambos aplicados sobre o tecido de base, liso, de preferência tonalizados dentro dos matizes de uma mesma cor. Então o estampado ali seria algo secundário e entraria como uma pequena parte do processo.
Idéias, moodboards, primeiros croquis, tecidos… momento de montar os elementos por cores e texturas e formas, em seguida imagens para a preparação do overview e por fim seu desenvolvimento e confecção.
Em visita à família, no Rio, o que parecia férias, se converteu, entre outras coisas, em um ensaio de fotos com as primeiras peças da coleção.
Dentro das expectativas, o desfile/expo num local natural e fresco seria o ideal e, sobretudo para o conceito da coleção, porém, sem fugir da idéia inicial: intimista e não menos importante em dimensão física. Mas ainda faltavam detalhes imprescindíveis para o look definitivo, entre eles, os acessórios. Alex De Haro, designer de joias catalão, que tem uma preciosa coleção, “Flor”, foi convidado a colaborar no desfile e participar da exposição. Surgiu a oportunidade de montar o evento num lugar especial situado nos jardins centenários do Hotel Rey Juan Carlos I, em Barcelona.
Abertura: 19hs Desfile: 20:30 (o que significa o entardecer de Barcelona, porque só anoitece depois das 21:30 da noite na primavera).
A coleção que sugeria um apelo naturalista foi unificada pelo espaço do desfile, num deck que cruza a piscina, cercada pelos jardins. Após o desfile, a aproximação do público assistente do processo que o antecede, do fazer, apresentando um espaço decorado ao estilo atelier, de como foi desenvolvido. O termo slow fashion, aqui também foi adequado, como algo “contemplativo”, um olhar atento aos detalhes, para a moda produzida com tempo e cuidado, pensando não somente em ações comerciais, como também em algo que vai além do vestir.
Criar, produzir, ver e testemunhar o processo criativo que resulta num desfile, nos leva à compreensão maior de um trabalho que tem o seu Mister, e porque não dizer, a sua arte.
Lorena Sender
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